terça-feira, 12 de outubro de 2010

Entre e fecha a porta...


Honestite


            Em dias em que os discursos tornam-se cada vez mais desprovidos de força de convencimento e transformação. Num contexto de sociedade condescendente com os desvios de conduta moral, pode-se ver o triunfo da maracutaia, da leviandade, da escrotidão, ou seja, do planalto da capital federal aos relacionamentos humanos, nos territórios mais distintos da vida humana, locupletar-se, obter vantagem, enganar, ludibriar, dar um “migué”. Não há sequer um confronto de verdades, é o embate glorioso das mentiras, das falácias políticas, dos embustes amorosos sem qualquer sinceridade.
            Produziu-se a mais nova doença do século XXI, a honestite, é a vergonha se ser honesto, de se portar dignamente, de ser fiel a sua esposa, de viver alegremente com o que se ganha sem precisar usar do cargo público para gatunar a sociedade, de esperar um documento ou andamento normal do processo judicial sem ficar corroendo-se na tentação de subornar a comarca inteira para adiantar dois meses o ganho de uma causa. Tem-se a estranha sensação que fazer o certo em determinados momento é coisa de idiotas, de bobões, de frustrados e incompetentes. Tem-se a absoluta certeza da existência de atalhos e caminhos mais fáceis, e assim perambulam pelas ruas da nossa moral: a paciência, a perseverança, o equilíbrio, ou seja, são meninos tristes orfanados pela sociedade.
            Nos órgãos policiais são premiados os cruéis pela beleza das sessões de tortura e extorsão. Os delegados mais espertos em roubar sem serem percebidos, são considerados patrimônios históricos da corporação, a eles são reservados funções essenciais na hierarquia.
            Mas a corrupção não restringi-se apenas a coisa pública, nos meios empresariais fraudar licitações é especialidade dos raros, fraudar balanço contábil é para poucos, enganar a comissão de fiscalização da bolsa de valores, e afinal, lavar dinheiro, ofício que quase nenhuma empregada doméstica sabe fazer. Todavia nessa capacidade de piorar infinita, os relacionamentos humanos estão em convulsão, ganha admiração na roda do bar o marido que trair mais a sua esposa, os filósofos dos copos constroem teorias transformadoras do mundo, mas não conseguem sequer suas famílias com a retidão merecida. Pedir perdão é tão fora de moda, pois aqueles que o fazem ascendem à categoria de seres divinais. Privatizou-se a indecência, agora é agasalhada nas mentes e corações.
            Nessa paranóia de ações espera-se ansiosamente pelo espetáculo da decência, do triunfo dos raros e nobres, não são necessários mártires, o mundo jamais se compadeceu deles, apenas os intelectuais os lêem, mas não praticam suas idéias. Na alvorada esperada os promotores denunciem os imorais, os policiais neguem o suborno e prezem pela vida humana, os juízes olhem mais uma vez para balança e a espada sempre por perto, os professores ensinem com alma e menos com as teorias educacionais, os homens olhem mais a alma do que a bunda das mulheres, elas por sua vez olhem pra si antes de ser olharem no espelho, e por favor, ensinem mais um vez aos seus filhos e netos não terem vergonha de serem honestos.



Vinicius Lúcio

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